quarta-feira, 10 de fevereiro de 2021

O AGRO NÃO É POP É POLUENTE

Por: Odilon de Mattos Filho:
A questão fundiária no Brasil é um dos gargalos que perdura desde o descobrimento do país. A concentração de terra no Brasil é uma das maiores do mundo, aliás, o Brasil é um dos poucos países do Planeta que não fez uma Reforma Agrária, ou uma Revolução Agrária para usar o termo mais apropriado.

A propósito e corroborando a afirmativa da concentração de terra no Brasil, dados do Censo Agropecuário de 2017, mostram que 1% dos grandes estabelecimentos detém quase a metade das terras de todos os estabelecimentos rurais brasileiros, o que é um absurdo para um país que tem um enorme contingente de pessoas sem terra e passando fome.

Além dessa concentração de terra, convivemos, também, com os sistemáticos conflitos por terra, que segundo a Comissão Pastoral da Terra (CPT) em 2010 “351.935 pessoas estavam em situação de conflito por terra. Hoje, esse número é de 578.968 pessoas distribuídas em todo o território nacional lutando pelo direito à terra e água1”. Aliás, documentos da CPT apontam que no ano de 2019 foi um “ano de ascensão da violência e do ódio contra os pobres, os negros, as comunidades e o povo do campo, protagonizados por figuras públicas, dentre elas, o Presidente da República”, não à toa, que o número de conflitos no campo é o maior dos últimos dez anos2”.

Sabemos que uma justa Reforma Agrária não só resolveria graves problemas sociais, mas, também, ajudaria sobremaneira a economia do país e a Agricultura Familiar que é um exemplo dessa afirmativa. Essa atividade é responsável pela economia de 90% dos municípios com até 20 mil habitantes e que 40% da PEA depende dessa atividade e que esse modelo é responsável por 38% do PIB brasileiro e responsável, também, por, exemplo, pela produção de 70% do feijão; 34% do arroz; 87% da mandioca; 60% do leite; 59% do rebanho suíno dentre outras produções, mas, mesmo diante destes dados, o atual governo federal vem, sistematicamente, diminuindo e cortando recursos financeiros para as políticas de Reforma Agrária e de apoio aos pequenos agricultores e à agricultura familiar.

No entanto, por o outro lado, o governo do genocida Jair Bolsonaro não mede esforços para privilegiar o agronegócio, tanto, que uma de suas medidas foi ampliar sua vantagem como recordista no número de agrotóxicos aprovados. Em 120 dias foram autorizados a utilização de mais 166 produtos, o que significa uma média de três a cada dois dias. Segundo, matéria do Site “Observatório do Agronegócio no Brasil”, entre os catorze rótulos que receberam concessão de uso, cinco são classificados pela Anvisa como “extremamente tóxicos”. Já foram aprovados 49 agrotóxicos classe I, a mais elevada na escala toxicológica estabelecida pela Anvisa...Somando os 24 rótulos classificados como altamente tóxicos, os produtos com grau elevado de toxicidade correspondem a 47% de todos os registros concedidos em 20193”.

Mas, os privilégios aos ruralistas do agronegócio, não se resumem apenas nas facilidades para o uso desenfreado dos venenos, as regalias também chegam nos bolsos dos latifundiários. Dados da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional mostram que 4.013 pessoas físicas e jurídicas detentoras de terra devem R$ 906 bilhões, uma dívida maior que o PIB de 26 estados. O montante é equivalente a metade do que todo o estado brasileiro arrecadou em 2015. Cada um dos 4.013 devedores tem dívidas acima de R$ 50 milhões e segundo dados do INCRA, “há um grupo ainda mais seleto de 729 proprietários que declararam possuir 4.057 imóveis rurais, somando uma dívida de R$ 200 bilhões. As terras pertencentes a esse grupo abrangem mais de 6,5 milhões de hectares, segundo informações cadastradas no Sistema Nacional de Cadastro Rural4”.

Para se vê o disparidade, com essas terras que, certamente, são ociosas ou utilizadas apenas para a monocultura, seria possível assentar 214.827 famílias, considerando o tamanho médio do lote de 30,58 ha/famílias assentadas. Trocando em miúdos, com as terras dos maiores devedores do Estado brasileiro, se poderia atender o dobro das 120 mil famílias acampadas e lutando por um pedaço de terra em 2015.

Mas, não obstante essas enormes dívidas com a União, não podemos nos esquecer que no governo Temer foi editada a Medida Provisória nº 733, que concede mais privilégios aos grandes ruralistas. Segundo o relatório da Oxam, a referida MP permite que produtores rurais inscritos em Dívida Ativa da União e com débitos originários das operações de securitização e Programa Especial de Saneamento de Ativos liquidem o saldo devedor com bônus entre 60% a 95%. Por exemplo, dívidas acima de R$ 1 milhão devem ter descontos de 65%, é mole?

Evidente que esse escandaloso desconto e/ou “perdão” das dívidas tem um componente da pressão dos latifundiários que, diga-se de passagem, a cada legislatura aumentam mais a bancada ruralista na Câmara dos Deputados e no Senado Federal em busca, unicamente, de defender os seus interesses, aliás, o aumento dessa categoria e de outras no Parlamento, é emblemático para demonstrar as deformidades do sistema eleitoral brasileiro que beneficia, cada vez mais, as classes dominantes do país.

Por fim, não podemos perder de vista, também, que grande parte das terras agricultáveis do pais estão sob a dominação das grandes corporações do mercado global dos agrotóxicos, das sementes e dos transgênicos e que sem nenhum escrúpulo utilizam o seu poderio financeiro para impor aos governos políticas que atendem, única e exclusivamente, os seus interesses.
 
Assim e diante destes poucos dados aqui trazidos temos a dimensão do gargalo desta questão fundiária no Brasil e do desinteresse dos governos, em especial de direita e da extrema direita em solucionar esse grave problema, ao contrário, esses governos viram as costas e junto com os grandes ruralistas e latifundiários procuram vender à sociedade, por meio das velhas narrativas, de que o agronegócio é de suma importância para a economia e para a mesa dos brasileiros, para tanto, utilizam-se, por exemplo, de milionárias propagandas divulgadas na mídia, como, por exemplo, a propaganda veiculada e apoiada pela Rede Globo, que tem como mote a seguinte frase:  “Agro é tech, Agro é Pop”. Realmente, pode ser tech, afinal, a tecnologia está tomando conta deste negócio, mas, está muito longe de ser Pop no sentido popular/musical, na verdade, este Pop nada mais é do que a abreviatura de "Poluentes Orgânicos Persistentes" (Pop's), aí sim faz sentido o mote, o "Agro é tech, Agro Pop”.



Um comentário:

  1. Quem produziria os alimentos que você e sua familinha consomem? Os vagabundos do MST?

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