Quando olho uma criança ela me inspira dois sentimentos, ternura pelo que é, e respeito pelo que posso ser.
Jean Piaget
O Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) sancionado em 1990, adota a Doutrina da Proteção Integral cujo pressuposto básico afirma que crianças e adolescentes devem ser vistos como pessoas em desenvolvimento, sujeitos de direitos e destinatários de proteção integral”.
Não
pairam dúvidas de que o “ECA” é reconhecidamente, uma das leis
mais avançadas do mundo no que tange à proteção da criança e do
adolescente. Mas malgrado esse entendimento, existe uma grande
resistência contra esse Estatuto, notadamente, com relação ao seu
artigo 104 que trata da inimputabilidade dos menores de 18 anos de
idade, aliás, medida adotada por mais de 40 países.
Sabemos
que a discussão sobre esse dispositivo somente aflora quando há
crimes de repercussão nacional, desencadeando discussões
hipócritas, simplistas e imediatistas sobre a necessidade da redução
da idade penal como a panaceia para resolver o problema do
envolvimento de adolescentes na criminalidade. E é o que está
acontecendo após os horrendos e estúpidos assassinatos do jovem
estudante de São Paulo e da dentista de São Bernardo dos Campos.
Evidente
que nós brasileiros ficamos estarrecidos com esses cruéis
assassinatos. Porém, o que não podemos aceitar é que essa
discussão descambe, como quer a mídia, para o falso argumento de
que os defensores da manutenção do artigo 104 do “ECA” não são
solidários às famílias que perderam seus entes assassinados. Assim
como não podemos aceitar que os defensores da
redução
da maioridade penal sintetize seus argumentos numa simples frase:
“Queria ver se fosse com você”.
Isso nos afigura inadmissível, empobrece o debate e pode gerar um
perigoso confronto no seio da sociedade.
Ademais,
se analisarmos os dados das Secretarias de Segurança Pública dos
Estados vamos verificar que, mesmo inaceitáveis, os números de atos
infracionais, especialmente, os homicídios, não são tão
frequentes quanto acredita a “opinião publicada”.
Aliás,
é curiosa a falsidade das elites e dos meios de comunicação quando
tratam desses dados. Sempre que necessitam citam os EUA como exemplo
no combate à criminalidade, especialmente, com relação à dureza
da legislação contra menores infratores. Porém, ardilosamente,
ocultam da sociedade dados sobre a ineficiência dessa legislação.
Nesse
sentido, a Professora Simone de Loiola Ferreira em brilhante Estudo
sobre o tema, ensina: “...o que muito não se divulga é que, nos
Estados Unidos, apesar da riqueza, dos investimentos em segurança
pública, tem-se um dos maiores índices de delitos praticados por
adolescente no mundo; já, no Brasil, apesar da desintegração
econômica, o país enfrenta condições bem distintas, apresentando
um grande avanço nas leis específicas ao tratamento desta
questão...De acordo com uma pesquisa realizada pelo Centro Nacional
de Justiça Juvenil, no ano de 2002, havia aproximadamente 2.261.000
jovens estadunidenses, com idade inferior a 18 anos presos. Enquanto
que no Brasil, os dados da Secretaria Nacional de Direitos Humanos,
aponta que uma média de 131.625 medidas sócio-educativas foram
aplicadas a adolescentes em conflito com a lei em todo o território
nacional no mesmo ano...”.
Dessa
maneira, e frente a esse estudo da Professora Simone Loila, fica
claro que o recrudescimento punitivo contra os adolescentes, como
acontece nos EUA, não vai coibir ou diminuir os atos infracionais.
Além disso, como bem afirma o filósofo Carlito Maia, " o problema do menor é o maior",
pois, são eles que cooptam os adolescentes para a prática
criminosa. Se reduzir a idade penal para 16 anos, os criminosos vão
buscar os menores de 15 anos. Portanto, o que se deve fazer é
aprimorar a nossa legislação e fazer com que as medidas
socioeducativas sejam verdadeiramente cumpridas, para que os jovens
infratores possam sentir o caráter punitivo da lei, e ao mesmo tempo
ter a oportunidade de se reintegrar à sociedade, mediante procedimentos que desenvolvem a sua capacidade intelectual, profissional e o seu retorno ao convívio familiar.
Por
essa e outras razões, entendemos que a discussão central deve se
ater à política de segurança pública e reconhecer que mesmo
diante dos avanços das políticas sociais, ainda temos muito a fazer
em prol de nossas crianças e adolescentes, pois, a grande maioria
encontra-se, fora das Escolas, sem acesso a cultura, lazer e renda,
ou seja, são seres vulneráveis e totalmente excluídos de nossa
sociedade. Essa é a nossa modesta opinião!
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