segunda-feira, 23 de novembro de 2020

RACISMO: “O SILÊNCIO É TRAIÇÃO”

Por: Odilon de Mattos Filho:
No dia 19 de Novembro de 2020, um dia antes de se “comemorar” o Dia da Consciência Negra, os brasileiros tomaram conhecimento do brutal assassinato do cidadão João Alberto Silveira Freitas de 40 anos de idade. O crime foi cometido dentro do estacionamento de um dos supermercados do Grupo Carrefour na cidade de Porto Alegre e foi praticado por seguranças daquele estabelecimento. Detalhe: “Beto” era negro. É mais um que entra para a triste e abominável estatística da prática de racismo em terras tupiniquins.

Não temos a menor dúvida de que o racismo no Brasil é estrutural e não há nenhum argumento que nos convença do contrário, pois, os dados, os estudos e a história corroboram tal afirmativa. Aliás, como bem afirma o professor de Direito, Silvio Almeida, “...Todo o racismo é estrutural porque o racismo não é um ato, o racismo é processo em que as condições de organização da sociedade reproduzem a subalternidade de determinados grupos que são identificados racialmente1".

A sentença da juíza Lissandra Reis Ceccon, de Capinas/SP ilustra bem o racismo estrutural a que se refere o Professor Silvio. Escreveu a magistrada: "...o réu não possui o estereótipo padrão de bandido, possui pele, olhos e cabelos claros, não estando sujeito a ser facilmente confundido2”. 

A propósito, os dados abaixo, também, nos mostram de maneira peremptória este racismo estrutural. A Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílio (Pnad) do IBGE, por exemplo, nos mostra que os negros têm maiores dificuldades de acesso à moradia, sete em cada dez pessoas que moram em casas com inadequação são pretos. Já a PUC/RS em parceria com a Rede de Observatórios da Dívida Social na América Latina mostram que os trabalhadores negros recebem salário 17% menor que o de brancos que têm a mesma origem social. Por sua vez, o Anuário Brasileiro de Segurança Pública aponta que oito em cada dez pessoas mortas pela polícia em 2019 eram negras. O Mapa da Violência elaborado em 2015 pela Faculdade Latino-Americana de Estudos Sociais nos mostra, também, que o número de mulheres negras assassinadas cresceu 54%, ao passo que o índice de feminicídios de brancas caiu 10% nos últimos dez anos. O Brasil tem a quarta maior população carcerária do mundo, onde 68% dos presos são pretos, segundo revela o Levantamento Nacional de Informações Penitenciárias (Infopen). 

Não podemos perder de vista, porém, que há outro fator que possa explicar esses dados: o próprio sistema capitalista. Neste sistema o negro é uma ferramenta para se rebaixar os salários e por conseguinte, a força de trabalho de toda sociedade e quando o negro se submete a qualquer salário, inevitavelmente, o desfecho nós conhecemos: as precárias condições de vida para a sua família com menos acesso à informação, piores vestimentas, alimentação e moradia, menor escolaridade etc, e de geração em geração o ciclo vai se completando, renovando e se perpetuando.

No entanto, mesmo diante destes dados, ainda há pessoas que sustentam que não há racismo ou discriminação racial no Brasil. Aliás, sobre essa afirmativa, temos uma curiosidade, ou melhor, um paradoxo dentro da mídia nativa. Temos acompanhado que a Rede Globo tem dado uma cobertura razoável e vem cumprindo o seu papel jornalístico de denunciar os casos de racismo no Brasil. No entanto, o próprio diretor de jornalismo da emissora prateada, Ali Kamel é autor de um livro intitulado,  “Não somos racistas”, no qual o autor critica a “Política de Cotas” adotada pelo governo Petista, evidenciando o seu lado preconceituoso e racista. 


Mas afora a insignificância deste “ilustre” jornalista e a sua postura escravocrata, o que nos causa repúdio e vergonha é a atitude das duas maiores autoridades do país terem esse mesmo comportamento e uma insensibilidade humana sem tamanho frente às barbaridades que acontecem no país, especialmente, quando o assunto é Direitos Humanos. Estamos falando do presidente e vice-presidente da república, Jair Bolsonaro e Hamilton Mourão. 

Logo depois do bárbaro assassinato do cidadão João Alberto o Vice-presidente da república, Hamilton Mourão em entrevista aos jornalistas, disse: "Lamentável né? Isso é lamentável. Em princípio, é segurança totalmente despreparada para a atividade que ele tem que fazer...Para mim, no Brasil não existe racismo. Isso é uma coisa que querem importar aqui para o Brasil. Isso não existe aqui2

Já o presidente Bolsonaro, um notório preconceituoso, sem qualquer palavra de solidariedade à família de João Alberto foi para redes sociais e escreveu o despautério sobre este caso: “...Existem diversos interesses para que se criem tensões entre nosso próprio povo. Um povo unido é um povo soberano, um povo dividido é um povo vulnerável...Não nos deixemos ser manipulados por grupos políticos. Como homem e como Presidente, sou daltônico: todos têm a mesma cor. Não existe uma cor de pele melhor do que as outras. Existem homens bons e homens maus. São nossas escolhas e valores que fazem a diferença...aqueles que instigam o povo à discórdia, fabricando e promovendo conflitos, atentam não somente contra a nação, mas contra nossa própria história...Quem prega isso está no lugar errado. Seu lugar é no lixo!3”. 

Nessa mesma linha de canalhice, como não poderia ser diferente, Eduardo Bolsonaro o nº 3, também, vomitou o seu excremento nas redes sociais: “Nosso repúdio ao espancamento fatal no Carrefour -Lula disse que a esquerda brasileira deveria copiar o quebra-quebra do Chile - “Conseguiram seu George Floyd para, sob pretexto de combater o racismo, de maneira organizada destruir tudo até talvez conseguirem nova constituinte4”. 

Realmente trata-se de mais um caso bárbaro de racismo no Brasil e não obstante, as inúmeras manifestações denunciando essa barbárie, temos que registrar que nos causa perplexidade a tímida reação dos brasileiros, que foi longe, mas, muito longe do que aconteceu nos EUA com o assassinado de George Floyd. Evidente, que estamos numa Pandemia e há muito receio ou medo de aglomerações que acontecem nas manifestações, todavia, antes mesmo da Pandemia, já aconteceram inúmeras atrocidades contra negros e contra outros grupos de minoria e as manifestações de rua foram tímidas, isoladas e muito aquém do esperado. 

O que nos preocupa e assusta com esse comportamento, é que essas barbáries estão aumentando, se banalizando e causando poucas indignações, isso é temerário, pois, sabemos que o país flerta com o obscurantismo e a falta de reações fortes podem encorajar os abutres de plantão a saltos mais altos. Portanto, não podemos e não devemos nos calar e intimidar frente a essas atrocidades cometidas contra os nossos irmãos negros, índios, moradores de rua, enfim, aos Direitos humanos, afinal, como bem afirma Martin Luther King “chega um momento em que o silencio é uma traição”. 


 



1 Fonte:  https://www.cut.org.br/noticias/saiba-o-que-e-racismo-estrutural-e-como-ele-se-organiza-no-brasil-0a7d 2-Fonte:https://migalhas.uol.com.br/quentes/297368/reu-nao-possui-estereotipo-padrao-de-bandido--possui-pele--olhos-e-cabelos-claros---diz-juiza-de-sp

3 Fonte: https://jornaldebrasilia.com.br/politica-e-poder/bolsonaro-ignora-morte-de-beto-freitas-e-diz-que-lugar-de-quem-prega-discordia-e-no-lixo/

4Fonte:https://www.poder360.com.br/congresso/eduardo-bolsonaro-sobre-caso-joao-alberto-conseguiram-seu-george-floyd/

 

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