quinta-feira, 5 de setembro de 2019

COMPULSÃO PELA TIRANIA

Por: Odilon de Mattos Filho
 
É difícil compreendermos que numa sociedade majoritariamente cristã e com vasta informação, possa existir, ainda, pessoas que defendem a tortura, a pena de morte as ditaduras, ou que praticam e alimentam a xenofobia, o racismo, o sexismo ou outras formas de preconceito. Mais difícil, ainda, é pensar que um Chefe de Estado, declaradamente cristão, pense, age e dissemine publicamente tal comportamento. 

A eleição de Bolsonaro, afora o momento que vivíamos e considerando todos os elementos que nos levam a crer que foi uma fraude eleitoral, não deixa de ser emblemático para comprovar esse torpe comportamento de boa parte da sociedade. Nessa mesma seara podemos citar a eleição do governador do Estado do Rio de Janeiro Wilson José Witzel. Trata-se de dois déspotas reconhecidamente, retrógrados, preconceituosos e fascistas. 

O comportamento tirânico do presidente da república já era conhecido desde o seu primeiro mandato como deputado federal, porém, era visto e tratado como uma figura caricata do baixo clero, sem visibilidade, ou seja, não passava de mais um deputado federal que se valendo de sua imunidade parlamentar vomitava suas ideias reacionárias e fascistas. O que poucos imaginavam é que ali estava tomando corpo uma criatura obscurantista, perigosa e antidemocrata. 

Eleito presidente da república Bolsonaro vem mostrando a que veio. No campo econômico o seu compromisso é com o capital nacional, internacional e com o sistema financeiro, para tanto, está entregando toda nossa riqueza natural, liquidando o nosso patrimônio e entregando aos banqueiros o maior patrimônio dos trabalhadores que é a previdência. Com relação às políticas sociais há o desmonte da educação, da saúde, da cultura e a flexibilização das leis trabalhistas. E na política externa a submissão suicída aos interesses do governo dos EUA. 

Além deste conjunto de politicas contrárias aos interesses do povo brasileiro, que, diga-se de passagem, era de conhecimento dos eleitores durante processo eleitoral, Bolsonaro nos agride, também, com a sua verborreia tacanha e inapropriada para o cargo. Além disso não esconde a sua compulsão pela tirania e um dos exemplos dessa afirmativa é o fato do Itamaraty decretar "censura no acesso a documentos que expliquem o motivo pelo qual o governo brasileiro passou a rejeitar, na ONU, o termo "igualdade de gênero" ou "educação sexual" em resoluções e textos oficiais até 2024". Mas, parece que essa compulsão é genética. O filho, Carlos Bolsonaro, conhecido como 02, postou em seu Twitter a seguinte ameaça: “por vias democráticas a transformação que o Brasil quer não acontecerá na velocidade que almejamos... e se isso acontecer. Só vejo todo dia a roda girando em torno do próprio eixo e os que sempre nos dominaram continuam nos dominando de jeitos diferentes!1". 

O presidente Bolsonaro sempre se notabilizou por este comportamento despótico. Na sessão de votação do impeachment da presidenta Dilma, por exemplo, Bolsonaro exaltou o coronel Ustra o monstro torturador de Dilma e de outros presos políticos. Depois, durante a campanha eleitoral Bolsonaro disse que o seu o livro de cabeceira é a “Verdade Sufocada”, de autoria tal coronel. Já como presidente da república e quando muitos imaginavam que pela liturgia do cargo o seu comportamento mudaria, ele sem nenhum pudor volta a agredir o povo brasileiro e as vítimas da ditadura militar. Quatro casos são emblemáticos. O primeiro, foi quando ordenou que os quarteis comemorassem o golpe militar no dia 31 de março. Depois foram as abjetas declarações ofensivas ao desaparecido político, Fernando Augusto de Santa Cruz Oliveira, pai do atual presidente da OAB, Felipe Santa Cruz. O terceiro caso, ou melhor a segunda bofetada na cara dos brasileiros, foi quando Bolsonaro ofereceu um almoço no Palácio do Planalto a viúva do coronel Ustra. E por fim, uma agressão internacional que enxovalhou a imagem do Brasil mundo afora e que carimbou de forma definitiva a tirania do presidente Bolsonaro. Em entrevista, a ex-presidenta do Chile e hoje Alta Comissária da ONU Michele Bachelet afirmou que “nos últimos meses, observamos (no Brasil) uma redução do espaço cívico e democrático, caracterizado por ataques contra defensores dos direitos humanos e restrições impostas ao trabalho da sociedade civil". A Alta Comissária evocou também, um aumento do número de pessoas mortas pela polícia, ressaltando que esta violência afeta desproporcionalmente os negros e as pessoas que vivem em favelas, lamentando ainda o "discurso público que legitima as execuções sumárias2”. 

Depois dessa declaração o presidente Bolsonaro não pestanejou e com o costumeiro destempero, arrogância e despreparo disparou contra Michele Bachelet dizendo: ”Ela está defendendo direitos humanos de vagabundos. Ela critica dizendo que o Brasil está perdendo seu espaço democrático. Senhora Michelle Bachelet, se não fosse o pessoal do Pinochet derrotar a esquerda em 73, entre eles seu pai, hoje o Chile seria uma Cuba. Eu acho que não preciso falar mais nada para ela3”. O pai de Bachelet, general Alberto Bachelet, foi torturado e morto durante a ditadura de Augusto Pinochet. 

Em resposta às agressões do presidente, Michelle Bachelet disse: “...a democracia não é perfeita. Mas é o melhor que temos (...) às vezes em alguns países, por vias democráticas, as pessoas elegem pessoas que não são democratas, que não acreditam em direitos humanos, que são racistas. O fato é que isso não estava escondido. Durante a campanha (eleitoral), eles disseram tudo aquilo e as pessoas o elegeram. Portanto, a democracia não é perfeita.4" 

Realmente, Bolsonaro é um ser maniqueísta, desprovido de sensibilidade moral e ética e possuidor de um comportamento obsessivo, doentio, uma espécie de tara incontrolável pelo sofrimento alheio. 

Aliás, neste sentido, a insuspeita jornalista Miriam Leitão que, diga-se passagem, colaborou para a eleição de Bolsonaro escreveu: “É patológica a compulsão de Bolsonaro pelas ditaduras e sua admiração ilimitada pelos regimes tirânicos, como o de Pinochet. É doentio seu prazer em ferir pessoas atingidas pelos crimes das ditaduras latino-americanas...5" . 

Este é o preço que o Brasil paga por não ter punido os agentes do estado que comandaram ou que participaram diretamente das barbáries cometidas durante os vinte anos de estado de exceção. Se, ainda, não foi instalada uma nova ditadura militar, certo é que estamos presenciando a instalação de uma nova Capitania hereditária. E assim, o Brasil segue a sua sina de carregar, para sempre, essa cicatriz da omissão que marca de forma indelével a democracia e a história do nosso País, favorecendo o surgimento de novos déspotas desejosos de presidir, ou melhor, de tocar o país. Fora Bolsonaro! 






















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