quinta-feira, 17 de maio de 2018

TORTURA NÃO É TAPINHA NO BUMBUM..!


Por: Odilon de Mattos Filho
É de conhecimento da sociedade que o Brasil viveu um das mais longas e cruéis ditaduras militares da América do Sul. O golpe militar que destituiu o presidente João Goulart em 1º de Abril de 1964 durou até março de 1985, foram 21 anos de Estado de Exceção, no qual políticos foram caçados, o Congresso Nacional foi fechado, a liberdade de manifestação, de pensamento e a liberdade de imprensa foram ceifadas, dentre outras rupturas com o regime democrático. 



Em 28 de agosto de 1979, diante da pressão popular, inclusive, da comunidade internacional os militares prepararam a abertura, porém, antes sancionaram a Lei de Anistia que na verdade foi elaborada para encobrir e anistiar os crimes cometidos pelos militares, que no futuro poderiam ser julgados e condenados. 



A história deste período de exceção sempre foi contada em duas versões: a oficial dá conta de que a “revolução” foi necessária para impedir que o Brasil se transformasse numa nação comunista, ou seja, o golpe foi necessário para a “redemocratização” do Brasil, conforme editorial do jornal “O Globo” do dia 02/04/1964, escrito por Roberto Marinho um dos grandes beneficiados pelos regime militar. Disse o barão da mídia: “Vive a Nação dias gloriosos. Porque souberam unir-se todos os patriotas, independentemente de vinculações políticas, simpatias ou opinião sobre problemas isolados, para salvar o que é essencial: a democracia, a lei e a ordem. Graças à decisão e ao heroísmo das Forças Armadas, que obedientes a seus chefes demonstraram a falta de visão dos que tentavam destruir a hierarquia e a disciplina, o Brasil livrou-se do Governo irresponsável, que insistia em arrastá-lo para rumos contrários à sua vocação e tradições..”. 


Já a história verdadeira contada por intelectuais e historiadores compromissados com a verdade, a ética e com a democracia mostra que o golpe militar foi uma trama montada pela burguesia dominante, por grupos da classe média, pelo empresariado local, pela UDN e por setores da Igreja Católica que não aceitavam as políticas de base que João Goulart queria implantar no Brasil, mais ou menos igual o que acontece hoje, a elite dominante não aceita as politicas de inclusão social realizadas pelos governos Lula/Dilma que liberta o pobre do jugo dos poderosos da Casa Grande. A propósito, vale destacar que o golpe militar do Brasil, assim como os demais na América do Sul, teve a importante participação e colaboração dos EUA que na época estava abrindo o mercado nundo afora.    

Realizado o golpe os militares começaram a “afastar” todos e tudo que poderia impedir ou dificultar a realização de seus objetivos. 

Evidente, que depois de se observar que o regime totalitário não seria provisório, como afirmaram os militares quando do golpe, começou a aparecer movimentos de resistência contra o regime de exceção, inclusive, a luta armada. O Movimento Estudantil, por exemplo, teve um papel importantíssimo nessa luta pela redemocratização do país, tanto, que foi o seguimento que mais sofreu com as torturas, assassinatos, enfim, com todo tipo de violações aos direitos humanos. 

Segundo relatório da Comissão Nacional da “1/2” Verdade que analisou os regimes ditatoriais de 1937 a 1945 (Estado Novo) e de 1964 a 1985 (Regime Militar) esses dois regimes de exceções foram responsáveis pelos assassinatos e desaparecimentos de 434 cidadãos. Mas segundo o jornalista Alceu Castilho esse número é muito maior, pois, não foram computados os assassinatos disfarçados pelo regime como suicídios, caso de Vladimir Herzog é emblemático e outros milhares que morreram em hospícios, em acidentes de trânsito e no campo. No texto o jornalista diz que “a própria Folha informou que a lista oficial de mortos pela ditadura pode ser ampliada: com mais 600 mortos além das 357 vítimas já registradas. São camponeses, sindicalistas, líderes rurais e religiosos, padres, advogados e ambientalistas mortos nos grotões do país entre 1961 e 19881". 

Ainda, com relação a esses regimes de exceção o jornalista João Paulo Caldeira disse que “foi durante a ditadura militar que as maiores atrocidades foram cometidas contra os que se opunham ao regime. Neste período os estudantes, os intelectuais, os engajados políticos, foram as principais vítimas do sistema que contestavam. Em plena Guerra Fria, a elite brasileira posicionou-se do lado dos Estados Unidos e da direita ideológica. Ser comunista passou a ser terrorista. Combatê-los era, segundo a visão do regime, defender a pátria de homens que comiam criancinhas, pregavam o ateísmo e destruíam as igrejas e os conceitos familiares. No engodo de proteger o Brasil da ameaça comunista, instalou-se uma ditadura, que para manter os princípios da caserna ortodoxa, calou, torturou e matou sem o menor constrangimento, centenas de brasileiros2”. 

Porém, mesmo diante das atrocidades cometidas pelo regime militar de 1964 até 1985, há, ainda, no país, como dito alhures, escritores, intelectuais e jornalistas que defendem esse regime. O jornalista e “historialista” Hélio Gaspari, denominado pelo jornalista Jeferson Miola de “padeiro-alquimista” publicou cinco volumes de uma obra, uma espécie de “pentologia” sobre o golpe militar e em um dos livros Hélio Gaspari vende a ideia de que o general Geisel foi um dos arquitetos da distensão que eliminou o núcleo duro do regime para abertura, e talvez, por essa razão, o apelidou de “Sacerdote”. 

Até pouco tempo essa obra foi uma espécie de referência sobre a ditadura militar, até que vazou o Memorando da CIA que veio jogar por terra toda antologia de Hélio Gaspari e corroborar o que alguns verdadeiros historiadores comprometidos com a verdade já sabiam sobre as atrocidades cometidas pela ditadura e pelo general Geisel, desmistificando assim, a história oficial que querem nos empurrar goela abaixo. 

O referido Memorando datado de 11/04/1974 foi elaborado pelo Diretor da CIA William Egan Colby com destino ao Secretário de Estado dos EUA Henry Kissinger e revelado no dia 10/05/2018 pelo pesquisador Matias Spektor, da Fundação Getúlio Vargas. Esse documento, segundo publicou o jornal O Globo ”... relata um encontro entre Geisel, João Batista Figueiredo, então chefe do Serviço Nacional de Informações (SNI), e os generais Milton Tavares de Souza e Confúcio Danton de Paula Avelino, ambos na ocasião no Centro de Inteligência do Exército (CIE)...O general Milton Tavares disse que o Brasil não poderia ignorar a "ameaça terrorista e subversiva", que os métodos "extra-legais deveriam continuar a ser empregados contra subversivos perigosos" e que, no ano anterior, 1973, 104 pessoas "nesta categoria" tinham sido sumariamente executadas pelo Centro de Inteligência do Exército...De acordo com a documentação, Geisel "disse ao general Figueiredo que a política deve continuar, mas deve-se tomar muito cuidado para assegurar que apenas subversivos perigosos fossem executados3". 

Na verdade esse documento serve para ratificar o que a Comissão Nacional da “1/2” Verdade apurou sobre as graves violações dos direitos humanos cometidos pelos governos militares de dentro dos gabinetes presidenciais da época de chumbo. 

E logo que surgiu esse bombástico documento da CIA não faltaram os infantilizados e idiotizados para rechaçá-lo ou tentar justificar o que ocorrera naqueles tempos sombrios. Pelos militares o discurso sobre as barbáries cometidas por eles é a de que a maioria das mortes teria ocorrido em confronto, ou de que seria resultado de excessos de determinados agentes do Estado. Já as vivandeiras civis apelam para o velho discurso de que o golpe foi para proteger o Brasil do comunismo e para defender a tradição, a família, a propriedade e outras baboseiras do gênero. Mas o que chamou atenção para justificar os crimes cometidos pelo general Ernesto Geisel foi a verborreia do caudilho Jair Bolsonaro que em entrevista à rádio “Super Notícia” de Belo Horizonte disse: “quem nunca deu um tapa no bumbum do filho e depois se arrependeu? Acontece!4

Com o vazamento desse documento não há mais nenhuma dúvida das atrocidades cometidas pelo regime de exceção, cabe a nós não esquecermos esse período de chumbo, afinal, como bem assinala o Historiador e Sociólogo Doutor Régine Robin , “o passado não é livre. Nenhuma sociedade o abandona a si mesmo. É regido, administrado, conservado, explicado, narrado, comemorado ou odiado. Seja que se celebre ou se oculte, segue sendo um desafio fundamental do presente”. 

Diante de tudo isso, em especial, do estarrecedor documento da CIA cabe agora ao STF agigantar-se e encorajar-se para rever a Lei de Anistia e punir, como aconteceu na Argentina e no Chile, todos os militares que participaram das barbáries cometidas durante o regime de exceção. Mortes e torturas cometidas pelas mãos do Estado não são “tapinhas no bumbum” são crimes hediondos que devem ser punidos no rigor da lei, doa a quem doer!



























2 Fonte: //jornalggn.com.br/noticia/a-tortura-e-os-mortos-na-ditadura-militar
3Fonte:https://g1.globo.com/politica/noticia/para-ex-membro-da-cnv-documento-sobre-geisel-e-estarrecedor-e-forcas-armadas-deveriam-reconhecer-responsabilidade.ghtml


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