Transcrevo do
sitio Conversa Afiada um excelente, corajoso e preciso texto de autoria do Doutor
Marcos César Danhoni Neves, Professor
titular da Universidade Estadual de Maringá. O texto coloca o juiz de piso
Sérgio Moro e o Procurador Deltan
Dallagnol, que sofre de “promotorite” no seu devido lugar, na insignificância
cientifica.
Sou professor
titular de Física numa universidade pública (Universidade Estadual de
Maringá-UEM) desde 2001 e docente e pesquisador há quase 30 anos. Sou
especialista em história e epistemologia da ciência, educação científica, além
de processos de ensino-aprendizagem e análise de discursos. Orientei mais de
250 alunos de graduação, especialização, mestrado, doutorado e pós-doutorado,
além de professores in-service. Conto tudo isso, como preâmbulo, não para me
gabar, mas para salientar que li milhares de páginas de alunos brilhantes,
medianos e regulares em suas argumentações de pesquisa.
Dito isso,
passo a analisar duas pessoas que compõem o imaginário mítico-heróico de nossa
contemporaneidade nacional: Sérgio Moro e Deltan Dallagnol. Em relação ao
primeiro, Moro, trabalhei ativamente para impedir, junto com um coletivo de
outros colegas, para que não recebesse o título de Doutor honoris causa pela
Universidade Estadual de Maringá. Moro tem um currículo péssimo: uma página no
sistema Lattes (do CNPq – Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico
ligado ao extinto MCT – Ministério da Ciência e Tecnologia). Lista somente 4
livros e 5 artigos publicados.
Mesmo sua
formação acadêmica é estranha: mestrado e doutorado obtidos em três anos. Isso
precisaria ser investigado, pois a formação mínima regulada pela CAPES-MEC
(Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior – Ministério da
Educação) é de 24 meses para Mestrado e 48 meses para o Doutorado. Significa
que “algo” ocorreu nessa formação apressada.. Que “algo” é esse, é necessário
apurar com rigor jurídico.
Além de
analisar a vida acadêmica de Moro para impedir que ele recebesse um título que
não merecia, analisei também um trabalho seminal que ele traduziu: “O uso de um
criminoso como testemunha: um problema especial”, de Stephen S. Trott. Mostrei
que Moro não entendeu nada do que traduziu sobre delação premiada e não seguiu
nada das cautelas apresentadas pelos casos daquele artigo.
Se seguirmos
o texto de mais de 200 páginas da condenação do presidente Luiz Inácio Lula da
Silva, e guiando-me pela minha experiência em pesquisa qualitativa, análise de
discurso e fenomenologia, notamos claramente que parte significativa do texto
consiste em Moro tentar apagar suas digitais, sem sucesso, ao desdizer que agiu
com imparcialidade.
Nestas
páginas robustas lemos uma declaração clara de culpa: Moro considera a parte da
defesa de Lula em menos de 1% do texto total!
E dos mais de
900 parágrafos, somente nos cinco finais alinhava sua denúncia e sentença sem
provas baseada num misto frankensteiniano de “explanacionismo” (uma “doutrina”
jurídica personalíssima criada por Deltan Dallagnol) e “teoria do domínio do
fato”, ou seja, sentença exarada sobre ilações, somente. Aqui uso a minha
experiência como professor e pesquisador: quando um estudante escreve um texto
(TCC, monografia, dissertação, tese, capítulo de livro, livro, ensaio, artigo),
considero o trabalho muito bom quando a conclusão é robusta e costura de forma
clara e argumentativa as premissas, a metodologia e as limitações do modelo
adotado de investigação.
Dissertações
e teses que finalizam com duas ou três páginas demonstram uma análise rápida,
superficial e incompetente. Estas reprovo imediatamente. Não quero
investigadores apressados, superficiais! Se Moro fosse meu aluno, eu o teria
reprovado com esta sentença ridícula e persecutória. Mal disfarçou sua pressa
em liquidar sua vítima. Em relação a outro personagem, o também vendedor de palestras
Deltan Dallagnol, há muito o que se dizer. Angariou um título de doutor honoris
causa numa faculdade privada cujo dono está sendo processado por falcatruas que
o MP deveria investigar. O promotor Dallagnol não seguiu uma única oitiva das
testemunhas de defesa e acusação de Lula, além daquela do próprio
ex-presidente.
Eu trabalho
em pós-graduações stricto sensu de duas universidades públicas: uma em Maringá
e outra em Ponta Grossa. Graças a isso fui contactado por meio de um coletivo
para averiguar a dúvida sobre a compra por parte de Dallagnol de apartamentos
do Programa Minha Casa Minha Vida em condomínio próximo à UEPG (Universidade
Estadual de Ponta Grossa). Visitei os imóveis guiado por uma corretora e me
dirigi ao Cartório de Registro de Imóveis da cidade.
Após algumas
semanas, a resposta: os dois apartamentos modestíssimos, destinados a gente
pobre, tinham sido adquiridos pelo Promotor e estavam à venda com um lucro
líquido em menos de um ano de aquisição de 135 mil reais.
Reuni o
material e disponibilizei para a imprensa livre (aqui a
matéria do DCM). O promotor teve que admitir que comprou os
apartamentos para ganhar dinheiro na especulação imobiliária, sem resquícios de
culpa ou de valores morais em ter adquirido imóveis destinados a famílias com
renda de até R$ 6.500,00 (Deltan chegou a ganhar mais de R$ 80.000,00 de
salários – além do teto constitucional, de cerca de R$ 35.000,00; e mais de R$
220.000,00 em suas suspeitosas palestras).
Bom, analisando os discursos de Dallagnol, notamos claramente a carga de
preconceito que o fez construir uma “doutrina” de nome exótico, o
“explanacionismo”, para obter a condenação de um acusado sem prova de crime.
Chega a usar de forma cosmética uma teoria de probabilidade – o bayesianismo –
que ele nem sequer conhece ao defender a relativização do conceito de prova:
vale seu auto-de-fé a qualquer materialidade de prova, corrompendo os
princípios basilares do Direito. Como meu aluno, ou candidato a uma banca de
defesa, eu também o teria reprovado: apressado, superficial e sem argumentação
lógica.
Resumindo:
Dallagnol e Moro ainda vestem fraldas na ciência do Direito. São guiados por
preconceitos e pela cegueira da política sobre o Jurídico. Quando tornei-me
professor titular aos 38 anos, eu o fiz baseado numa obra maturada em dezenas e
dezenas de artigos, livros, capítulos, orientações de estudantes e coordenações
de projetos de pesquisa. Infelizmente, estes dois personagens de nossa
República contemporânea seriam reprovados em qualquer universidade séria por
apresentar teses tão esdrúxulas, pouco argumentativas e vazias de provas. Mas a
“Justiça” brasileira está arquitetada sobre o princípio da incompetência, da
vilania e do desprezo à Democracia.
Neste
contexto, Moro e Dallagnol se consagram como “heróis” de papel que ficariam
muito bem sob a custódia de um Mussolini ou de Roland Freisler, que era o
presidente do Volksgerichtshof, o Tribunal Popular da Alemanha nazista. Estamos
sob o domínio do medo e do neo-integralismo brasileiro.
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