terça-feira, 20 de dezembro de 2022

COPA DO QATAR: DO GLAMOUR AS VIOLAÇÕES DOS DIREITOS HUMANOS

Por: Odilon de Mattos Filho
No domingo, dia 18/12/2022 o Planeta Terra parou para ver a grande final da Copa do Mundo do Qatar entre as seleções da Argentina e França, com a vitória do hermanos na disputa dos pênaltis. 

Com essa Copa do Qatar completou-se a 22ª edição da maior competição de futebol do mundo desde a primeira em 1930 no Uruguai. Essa história começa em 1928 com o francês Jules Rimet que dá o ponta pé inicial na organização desse evento. Aliás, a Taça Jules Rimet foi entregue aos capitães das seleções vencedoras das Copas do Mundo dos anos de 1930 até 1970, já a partir da Copa do Mundo de 1974, o Troféu passou a denominar-se Troféu Copa do Mundo FIFA.

Os grandes vencedores da Copa do Mundo estão divididos em apenas dois continentes: Americano e Europeu. O primeiro tem 10 e o segundo 12 títulos. A América tem os seguintes campeões: Brasil maior vencedor com 5 títulos, Argentina 3 títulos e Uruguai 2 títulos. Europa: Alemanha 4 títulos, Itália 4 títulos, França 3 títulos e Espanha 1 título.

A Seleção brasileira além de ser a equipe com maior número de títulos, foi a única a participar das 22 edições da Copa do Mundo e tem o segundo maior artilheiro dessa competição, o ex-jogador, Ronaldo ”Fenômeno” com 15 gols, sendo o primeiro artilheiro o jogador da Alemanha Miroslav Klose com 16 gols.

A Copa do Mundo antes vista como um popular torneio de futebol e com pouca badalação, passou depois da Copa de 1970 ou 1974, a ser uma competição onde a força da grana e a corrupção dominam a organização do evento, ou seja, a Copa do Mundo se transformou em um verdadeiro show business. Não à toa, que por imposição da FIFA as sedes da Copa do Mundo são obrigadas a construir luxuosas Arenas no lugar dos populares estádios e os valores dos ingressos são estupidamente majorados o que mostra, contraditoriamente, que o futebol que já foi o esporte mais popular do mundo, caminha, passos lagos, para ser o esporte mais elitizado do mundo.

A última edição da Copa do Mundo que acabamos de assistir no Qatar é emblemática e corrobora a afirmação do poder do dinheiro e a corrupção que campeia na organização dessa competição. Segundo o site da CNN Brasil “...a eleição do Qatar foi cercada de controvérsias. Uma investigação de 2014 do jornal inglês Sunday Times afirmou que o pais árabe pagou mais de U$$ 5 milhões, cerca de R$ 25,7 milhões em propinas para garantir apoio à sua candidatura. A acusação, baseada em e-mails detalhando os supostos pagamentos, ganhou força já que o Catar foi considerado um local de alto risco de acordo com relatórios da própria FIFA, dado o calor intenso. A situação fez com que o campeonato fosse adiado para novembro, em medida excepcional..1

Mas além desse caso de corrupção a copa do Qatar foi marcada, também, por várias outras denúncias, como por exemplo, censura, violações das liberdades individuais e dos direitos humanos, em especial contra membros da comunidade LGBTQIA+, violência contra mulheres, contra imigrantes, jornalistas, etc. Mas se tudo isso não bastasse, houve inúmeras denúncias durante a construção das Arenas esportivas onde os trabalhadores foram submetidos a um regime análogo ao da escravidão. O Qatar possui um sistema de trabalho denominado kafala que é um sistema de trabalho predominante do país e de outros países do Golfo Pérsico. Neste sistema os trabalhadores são obrigados a trabalhar de segunda a domingo, sem medidas de segurança, sob temperaturas extremas, vivendo amontoados em acampamentos que as próprias empresas colocam à sua disposição, onde dividem um quarto com até oito pessoas, sem higiene, sem proteção e com precária alimentação.

A propósito, artigo publicado pelo jornal inglês The Guardian noticia que “mais de 6.500 trabalhadores imigrantes da Índia, Paquistão, Nepal, Bangladesh e Siri Lanka morreram no Catar nos últimos 10 anos. Os trabalhadores imigrantes que trabalharam para as obras de preparação da Copa do Mundo foram vítimas de abusos sistemáticos e, em alguns casos, até trabalho forçado, segundo relatório divulgado pela organização Anistia Internacional. Além disso, os imigrantes não possuem permissão para sair do país, nem para mudar de empresa ou empregador e tiveram seus passaportes e documentos de identidade retidos.2"

Realmente, muita coisa foi denunciada antes e depois da Copa do Mundo, mas o que nos chama atenção é como a FIFA, fechou os olhos para essas atrocidades que acontecem no Qatar e, ainda, se submeteu a vontade da ditadura monárquica e ameaçou e censurou os atletas de fazer qualquer tipo de protesto ou manifestação em favor da comunidade LGBTQIA+ e de outros grupos minoritários. Aliás, sete seleções europeias haviam decidido utilizar a braçadeira de capitão com as cores do arco-íris LGBTQ+, porém, devido às ameaças da Fifa de, além de aplicar multas, também punir com cartões amarelos os jogadores, as equipes acabaram optando por suspender a manifestação.

Mas, não obstante essas censuras a Copa do Qatar tentou de todas as formas passar uma imagem de inclusão social e para tanto, a organização usou e abusou do tokenismo e do diversity washing, em especial na abertura do evento. O tokenismo (token símbolo em inglês) é um conceito que se presta a explicar uma inclusão simbólica e pontual (por meio de uma pessoa ou de um “símbolo”) fazendo concessões superficiais a grupos minoritários, transmitindo uma imagem progressista somente para gerar uma sensação de igualdade. Já a diversity washing (lavagem da diversidade) muito comum nas empresas e marcas é utilizada em campanhas e posicionamentos em prol da diversidade, dando visibilidade em diversos canais e aumentando o valor da marca, porém, sem ter ações internas e uma cultura verdadeiramente inclusiva na interação com seus stakeholders (acionistas).

Mas mesmo diante das tentativas de camuflagens das atrocidades cometidas no país sede da Copa, o Torneio, malgrado os resultados esportivos serem positivos, ficou marcado negativamente. Aliás, a grande jornalista Milly Lacombe, resumiu bem o que foi a competição: "..Termina a Copa do Mundo da ditadura do Qatar. O futebol, soberano, prevalece sobre as ruínas morais da Fifa, do absolutismo monárquico dos anfitriões, da censura a manifestações políticas, da ausência de mulheres e de pessoas LGBTQs...O Qatar é indefensável e a Fifa deve ser corresponsável pelo horror...Foi a Copa num país em que não ser um homem local de comportamento heterossexual faz de você um ser humano inferior. [Nessa Copa] tudo foi feito por homens para homens entre homens...3


Essa foi a copa do mundo no Qatar que além de levantar uma série de reflexões sobre diversidade, inclusão e os malefícios do capitalismo na nossa sociedade, no campo esportivo deixou um legado que veio dos nossos hermanos da seleção Argentina: um time com muito foco, planejamento, coletividade e muita garra e tudo isso somado à genialidade de um atleta "extraterrestre" chamado Lionel Messi, só poderia ter um resultado: Argentina, depois de 36 anos, conquista o seu terceiro título mundial. Parabéns aos nossos hermanos argentinos que tão bem representou a  "Gran Patria Latino-americana".


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