Por: Odilon de Mattos Filho
É consenso que o Futebol no Brasil é o esporte de maior expressão popular e o responsável pelas principais pautas socioculturais e políticas do país.
O futebol chegou ao Brasil em 1894 por intermédio de um jovem filho de ingleses chamado Charles Miller, mas, segundo o historiador José Moraes dos Santos Neto um pouco antes, por volta de 1879 e 1881 os jesuítas do Colégio São Luís da cidade de Itu visitaram grandes colégios na Europa que já praticavam o futebol e trouxeram essa modalidade esportiva para o Brasil.
Sabe-se que o primeiro clube formado, especialmente, para a prática do futebol, foi o paulista da Associação Atlética Mackenzie College em 1898 e o primeiro Clube de futebol do Rio de Janeiro foi o Fluminense Football Clube, fundado em 1902.
Já no início da década de trinta, no governo Getúlio Vargas começou a investir nos esportes com ações coletivas que buscavam alcançar a maior quantidade de pessoas possíveis e foi neste contexto que a prática do futebol foi crescendo, se popularizando e se constituindo como um elemento formador da identidade nacional à medida que foi ganhando adeptos Brasil afora.
Aliás, foi em 1933, que a Confederação Brasileira de Desportos formalizou a atividade profissional do futebol e devido ao grande contingente de camadas sociais menos favorecidas do país o futebol passou a ser uma das alternativas dessa classe para sair ou minimizar as condições de extrema pobreza.
Passados quase noventa anos da profissionalização do futebol e trazendo a novidade do Velho Continente, alguns Clubes de futebol do Brasil começam a deixar de serem clubes associativos para se tornarem clubes-empresas e isso só foi possível com a promulgação da Lei n 14.193/2021, que criou a Sociedade Anônima do Futebol, conhecida como SAF, uma lei que, diga-se de passagem, foi pouco debatida no Congresso Nacional, mas, que teve um lobby pesadíssimo de empresários nacionais e internacionais que defendiam a sua aprovação como a panaceia para o falido futebol brasileiro. Começa assim, uma espécie de privatização do futebol brasileiro.
Aliás, esse mesmo discurso, ouvimos quando surgiu o movimento de arenização nos anos 2010, que transformaram os velhos e populares Estádios em Arenas modernas, seguras e confortáveis para os torcedores, mas, que por outro lado, proporcionou uma exclusão social, transformando o popular futebol brasileiro em um esporte elitizado, pois poucos torcedores podem arcar com os elevados preços dos ingressos que ajudam a pagar as pomposas Arenas frequentadas por uma minoria endinheirada.
Mas, voltando à SAF, essa experiência do Clube-empresa é muito lembrada a partir dos Clubes da Inglaterra que participam da festejada Premier League, mas ao contrário daqueles que defendem com unhas e dentes a iniciativa privada, essa nova modalidade de gestão do futebol tem, também, os seus senões e controvérsias, pois, não podemos nos esquecer de que se trata de empresas privadas mantidas por investidores e como tal o único objetivo é o lucro acima de qualquer paixão.
Aliás, o grande jornalista Irlan Simões aponta que na Inglaterra “...torcedores, organizados em coletivos, grupos ou movimentos, protestam contra os proprietários ou mandatários dos seus clubes, demandam reformas estruturais no futebol atual, reivindicam um papel mais importante como atores do futebol e do processo histórico de formação dos clubes enquanto instituições sociais coletivas1”.
Com relação ao Brasil o mesmo jornalista diz que “...nos últimos três anos a discussão da transformação dos clubes brasileiros em sociedades empresárias (ou clubes-empresa) já mostrou a reprodução de um método de atuação semelhante. Primeiro se faz a referência sem ponderações ao futebol europeu – através da proposta de replicação de fórmulas infalíveis para o alcance de um sucesso financeiro equivalente -, depois se misturam os interesses privados com os “benefícios coletivos” em meio a essas proposições – dado que essas empresas atuam nesse mercado e buscam sempre expandir seu campo de atuação -; e posteriormente o processo de abstenção geral de qualquer responsabilidade por eventuais problemas de percursos ou fracassos retumbantes – como ocorreu às arenas e como a empresarização dos clubes já provou ser em diversos países2”.
E realmente assiste razão ao citado jornalista, mal começou a SAF e já estourou o primeiro escândalo que foi a compra do Cruzeiro Futebol Clube pelo seu ex-jogador Ronaldo Nazário, que me recuso chamá-lo de fenômeno, em respeito aos grandes jogadores deste país como Pelé e Garrincha. Esse escândalo envolve a diretoria do Cruzeiro, a empresa XP que seria a intermediadora contratada pelo Clube, mas que tudo indica, favoreceu o comprador e mostrou, também a total falta de transparência nas negociações, inclusive, na escolha da empresa do Ronaldo, ou seja, estamos diante de uma cadeia de movimentos típicos de empresários e investidores que têm em mente tão somente o lucro, as favas os torcedores e a história do Clube.
Mas não obstante os vários senões com a SAF, evidente que não dá para defender o atual modelo de gestão dos Clubes de Futebol do Brasil, pois, é sabido que a maioria dos clubes encontra-se falidos, tomados pela corrupção e com gestões ultrapassadas, o que defendemos, levando em conta que os Clubes utilizam recursos públicos, seria criar mecanismos legais de fiscalização externa por meio da Receita Federal e do Ministério Público, por exemplo, e o controle interno das administrações dos clubes por mecanismos de compliance, além de outras exigências de transparência.
Portanto, aqueles que defendem o “deus mercado” aqui representado pela SAF muita calma, pois, está claro que esses “investidores” não têm o menor interesse em conhecer a história e a importância dos Times de Futebol do Brasil e tampouco a relação dos torcedores com os seus clubes, pois, como investidores capitalistas o futebol não passa de mera mercadoria e os clubes poderosas fábricas que produzem a principal matéria-prima que são os jogadores. Aos torcedores, dentro de suas possiblidades, cabe ficar atentos a esses movimentos, afinal, Karl Marx nos alerta que “...sem sombra de dúvida, a vontade do capitalista consiste em encher os bolsos, o mais que possa. E o que temos a fazer não é divagar acerca da sua vontade, mas investigar o seu poder, os limites desse poder e o caráter desses limites”. Estamos de olho!
2 Fonte: https://nabancada.online/2020/11/13/bom-para-quem-das-promessas-ao-futebol-brasileiro-arena-clube-empresa-e-o-direito-do-mandante/
0 comentários:
Postar um comentário