Por: Odilon de Mattos Filho
É sabido que um dos braços fortes do capitalismo em decomposição é o sistema financeiro. Um conjunto de entidades e instituições altamente lucrativo, expropriador e explorador que tem os seus tentáculos espalhados por vários lugares chaves, como, por exemplo, na mídia, nos Partidos Políticos, nos Parlamentos, no Sistema Judiciário e nos governos mundo afora.
Aliás, para compreendemos melhor o atual sistema de rapina (Bancos) vale ler “O Capital do Século XX” de Thomas Piketty que dentre outros pontos analisa a financeirização, a armadilha da dívida pública e a concentração da riqueza no planeta.
No Brasil essa percepção da promiscuidade entre o sistema financeiro e o Estado é muito maior, tanto, que até em governos ditos de esquerdas, como aconteceu nos mandatos de Lula e Dilma o sistema estava muito bem representado, Henrique Meireles e Joaquim Levy são exemplos clássicos dessa afirmativa, aliás, a grande maioria dos presidentes do Banco Central do Brasil (BCB) são oriundos do Sistema Financeiro.
Aqui em terras tupiniquins, os banqueiros para ampliar seus lucros lutaram por anos a fio pela autonomia e independência do BCB, até que no atual governo de extrema direita conseguiram realizar o seu grande desejo, ou seja, o governo abriu mão da nossa soberania monetária e a colocou nas mãos do mercado e do sistema financeiro nacional e internacional, trocando em miúdos, colocou a rapousa dentro do galinheiro. Aliás, a velha narrativa daqueles que defendem a autonomia sempre foi a de que o BCB nas mãos dos não políticos contribuirá para uma maior estabilidade monetária, pois, não estará sobre a pressão política, ao contrário, desenvolverá o seu trabalho sempre pautado pela racionalidade da tecnocracia. Um argumento, como veremos a seguir, que não se sustenta e que não passa de uma balela descarada e desvergonhosa para enganar o povo,
Neste contexto, explodiu um escândalo no mundo financeiro brasileiro, nessa última semana do mês de outubro, que desmontou por completo essa narrativa dos banqueiros. Um áudio vazado do banqueiro André Esteves dono do BTG Pactual, que tem no ministro Paulo Guedes um de seus fundadores, mostrou as entranhas do conluio entre banqueiros, políticos, governo e o BCB.
O áudio é de uma Conferência fechada do BTG Pactual, ocorrida no dia 21/10/2021 e vazado para o Portal 247. Nessa conferência André Esteves disse que convenceu ministros do STF, que à época analisavam uma ação sobre o tema, da importância da independência do BCB. Disse, ainda, que recebeu uma ligação do presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL), perguntando sobre a repercussão no mercado, da saída de quatro assessores do Ministério da Economia, mostrando uma intimidade incomum com o presidente da Câmara, e foi mais longe: assumiu, também, a paternidade da Emenda Constitucional do Teto de Gastos que congelou recursos da saúde e da educação por vinte anos, aliás, sobre essa EC vale citar as precisas e sábias palavras de Jeferson Miola que disse “...EC representou o pacto das oligarquias para oportunizar o aumento da apropriação dos fundos públicos pelo rentismo em prejuízo da maioria da população, sacrificada com cortes em áreas essenciais como SUS, educação e políticas sociais...1”
Nesse mesmo áudio André Esteves afirma que um ano atrás foi consultado pelo presidente do BCB, Roberto Campos Neto sobre o limite para a queda da taxa de juros Selic e em seguida relatou aos participantes da Conferência a sua conversa com presidente do BC: “Eu achei que a gente meio que caiu demais os juros na pandemia, para esses 2%. Eu me lembro que tem um conceito que chama lower bound, alguns aqui já devem ter ouvido falar, que é qual a taxa de juros mínima. E eu me lembro que o juros tava assim em uns 3,5% e o Roberto me ligou para perguntar: ‘pô, André, o que você está achando disso, onde você acha que está o lower bound?’. Eu falei assim: ‘olha, Roberto, eu não sei onde que está, mas eu estou vendo pelo retrovisor, porque a gente já passou por ele. A gente… acho que em algum momento a gente se achou inglês demais e levamos esse juros para 2% o que eu acho que é um pouquinho fora de apreço. Acho que a gente não comporta ainda esse juros2”.
Esse aconselhamento do presidente do BCB com o banqueiro André Esteves é a mesma coisa que um juiz combinar com o presidente de um time de futebol o resultado do jogo que vai apitar. Isso é escandaloso, imoral e mostra a promiscuidade e a submissão da área econômica do governo e do BCB aos banqueiros de plantão. E aqui não podemos deixar de destacar o papel da mídia que incobre e é partícipe desses abjetos aranjos que ao longos dos anos está nos conduzindo a um perigoso retrocesso civilizatório, vide o desgoverno Bolsonaro.
Após essas revelações, o presidente do BCB, que, diga-se de passagem, possui milhões em paraísos fiscais, conforme denunciado pelo “Consórcio Internacional de Jornalistas investigativos” (ICIJ), soltou uma Nota afirmando que isso “...é da prática de bancos centrais e de autoridades de supervisão no mundo. Os membros da Diretoria Colegiada do Banco Central do Brasil mantêm contatos institucionais periódicos com executivos de mercados e esses contatos incluem dirigentes de instituições financeiras.3.”
Evidente que essa Nota é uma afronta, pois, mesmo discordando dessa prática, mas considerando essas "conversas" o certo é que elas deveriam ser realizadas em reuniões públicas, transparentes e devidamente agendadas e não por telefone de maneira sorrateira e altamente suspeita e comprometedora.
Assim, não pairam dúvidas que diante desse escândalo, o presidente do BCB deveria pedir demissão do seu cargo ou o Conselho Monetário Nacional deveria submeter ao presidente da república e ao senado federal a proposta de sua exoneração, aliás, a denúncia do (ICIJ) já seria suficiente para essa demissão, não só dele, mas, também, de Paulo Guedes que escondeu uma fortuna nos paraísos fiscais. Mas, lamentavelmente, no atual momento que o país vive, a falta de ética, moral e até o crime, são, solenemente ignorados pelas velhas e aparelhadas instituições que deveriam fiscalizar e punir esses infratores.
Dessa forma, está muito claro que as relações de poder da direita continuam fortemente baseadas, como afirma Emir Sader "....no sistema financeiro e no monopólio privado da mídia que são as suas bases fundamentais de sustentação. Aí resiste, no essencial, o poder, mesmo nos países onde predominam politicas posneoliberais4".
Diante de tudo isso é fácil responder a pergunta do título deste texto: Os banqueiros governam o Brasil? A reposta é simples e objetiva: sim!
1 Fonte: https://www.brasil247.com/blog/banqueiro-do-btg-mostra-brasil-capturado-pelo-rentismo
2 Fonte: https://www.poder360.com.br/economia/andre-esteves-do-btg-diz-ser-consultado-por-campos-neto-sobre-piso-de-juros/3 Fonte: https://www.brasil247.com/economia/presidente-do-banco-central-confirma-consulta-a-andre-esteves-sobre-taxa-de-juros-e-diz-que-e-pratica-de-bancos-centrais
4-Fonte:https://www.cartamaior.com.br/?/Blog/Blog-do-Emir/O-poder-cade-o-poder-/2/30934
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